quinta-feira, 9 de setembro de 2021

44 árvores cortadas.

Nasci aqui em Bauru.
Sempre morei numa região perto de um lugar chamado Praça Portugal.

Praça com muitas árvores.
Ontem eu vi elas no chão. 
Nem liguei.
Eu também estava no chão. 

Não tem nenhuma razão que impeça. 
Estou vendo o mundo prosperar.
Em nome do progresso, eles dizem.

O velho vai ficando sem utilidade.
A renovação se impõe. 
As decisões mudam de tempos em tempos nas mãos dos governantes.
Poucos se importam.

Eu mesma, estava tão dentro de mim, indo ao banco naquela região. 
Minha senha era número 44
...igual ao número de árvores condenadas a morrer. 

Eu e as árvores estamos morrendo.
Me sinto com a raíz exposta.

O progresso não está preocupado com sombra, qualidade de ar e ...olhar amoroso.

Todo dia eu morro um pouco junto com o mundo.
Todo dia sou lembrada que devo soltar das mãos do apego.

A modernidade exige que tenhamos engajamento. 
Todo dia produzir um conteúdo atrativo nas redes sociais.
Negociar com o poder, com a matéria é uma lei que não consegui obedecer com muita competência. 

Já chorei por muitas árvores na minha vida.
Ontem, veja só, nem liguei.

Vi motosserra, raíz de tudo quanto é tamanho secando ao sol, fora da terra.
Parecia que tinha estourado uma bomba.
Galhos cortados aos montes.

Sabe no que reparei?

Nas fitas plásticas preta e amarelo que contornava a Praça impedindo  acesso.

Na verdade, é meu único jeito de sobreviver, é não acessar essa realidade.

Eu estou tão árvore...
Vendo chegar homens armados com motoserra.
Botas pretas.
Andar pesado e mãos fortes.
Trator bufando.
Eu acho que todo trator é mal humorado.
Trator quando chega, não negocia.

Em nome do progresso, em nome Deus, em nome do poder, em nome de interesses vão revirar a terra.

Eu, minhoca ou cobra cega, vou tentar escapar do corte de uma enxada. 
Elas têm lâmina afiada.
Vão me cortar ao meio e nem vão sentir remorso.

Eu, alma, vou voar da copa das árvores quando elas tombarem.
Árvores altas que o pintor Vicent Van Gogh retratou tão bem.
Vou tentar, num pulo só chegar ao céu. 
Aquele céu espiralado.
Onde o sol e as estrelas podem me servir de leito.

Talvez algum anjo queira ouvir minha poesia.

Vivi Ame...Viviane Mendes

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