Que cor era a calcinha?
Calcinhas Kely
Não deforma.
A loja se situava na rua Joaquim da Silva Martha,
16 -48, aqui na cidade de Bauru.
ABRI O SAQUINHO.
Dentro dele, muito bem dobrado e arrumadinho todos os telegramas recebidos no casamento.
Dentro de uma embalagem de guardar calcinha.
Coincidência?
Ou memórias calientes da tal calcinha?
Eu faria igual minha mãe.
...ia guardar o saquinho.
Achei o bilhete da Air France.
Foi sozinha.
Antes de eu nascer.
O plano era morar em Paris.
Veio aqui pra acertar umas coisas.
Conheceu meu pai, engravidou.
Guardou tudo que lembrava a viagem, e que se Deus quisesse, um dia ia voltar.
Deus não quis.
Como uma relíquia guardou a carta de um Cônsul avisando que a frasqueira perdida no aeroporto foi encontrada.
Na lista consta o diploma da Sorbonne.
A carta é de 1970.
Fico aqui pensando...
Na família do meu pai e da minha mãe.
A minha família paterna era exibida.
Tudo tonto.
Meu avô tinha melhorado de vida.
Presidente do Rotary.
Diretor do banco Mercantil.
Meus tios e tias tudo deslumbrado.
Meu pai não.
Ele era diferente.
Eu escutava a família de Bauru, tirando sarro da família de Timburi.
Falavam que no dia do casamento tinha um penico no banheiro.
Aqueles penico de Ágata.
...e tinha mesmo.
Eu lembro dele.
Diziam que eles, caipiras, não tinha modos.
Assim, tipo, modo de gente metida.
Num tinham mesmo.
Eram tudo uns caiporas.
Trabalho duro.
Fazendeiro mas com serviço de roça.
Cidade muito pequena.
Minha mãe era diferente.
Foi estudar na França.
Ainda bem que eles se encontraram.
Ele era diferente.
Ela era diferente.
Eu nasci de um encontro de iguais.
A cor da calcinha eu nunca vou saber.
Talvez ela usou no dia que engravidou.
Os telegramas guardados desejando felicidades aos nubentes, ficaram intactos, guardados dentro de saquinho de plástico de calcinha.
Li todos.
As palavras custavam caro no telegrama.
Pensando aqui, foi um casamento feliz.
Um enlace matrimonial abençoado.
Curto.
Intenso.
Trágico pela morte prematura do meu pai.
...e pela vida que minha teve que engolir.
Sou fruto disso.
Uma fruta que não nasceu em árvore genealógica.
Nasci, quem sabe, no momento que ela tirou essa calcinha.
Sou o resultado de um encontro.
E encontro de alma é celebração.
Hoje revirei esse passado, serenamente.
Por volta das 16 horas, chuva fina lá fora.
Acho que eles, Ciro e Elenice, que se casaram no dia 25 de julho na resistência da noiva,
Rua da Paz, 364 com penico no banheiro tão aqui do meu lado, rindo.
Sobrevivi.
Vivi Ame...Viviane Mendes
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